O caminho é ao centro personalista; largou à frente na disputa presidencial quem compreendeu isso

 O caminho é ao centro personalista; largou à frente na disputa presidencial quem compreendeu isso

Imagem: Sérgio Lima/Poder 360

 

Quem observa o cenário político atual como uma campanha de extremos pode estar equivocado. De um lado, Jair Messias Bolsonaro (PL), e do outro, Luís Inácio Lula da Silva (PT), como se ambos representassem a extrema-direita e a extrema-esquerda, respectivamente.

Creio que, talvez, parte da direita política esteja dividida com relação a Bolsonaro à frente da presidência da República. Por outro lado, porém, é preciso considerar que Lula e Geraldo Alckmin (PSB) compreenderam, há tempos, que o caminho ao êxito eleitoral, após tantas instabilidades, era mais ao centro personalista. Desde então, como esperado, as articulações se deram ao redor disso, com comedidas sinalizações às pautas tradicionais defendidas pela esquerda, e com mais cuidado ainda ao tentar tocar o solo conservador da direita.

“Com o Lula, o Brasil irá virar uma Venezuela, uma Cuba”, dizem alguns por aí. Realmente não compreendo o tom ou o intuito desse comentário, se não o de amparar-se em um modelo já ultrapassado de campanha, empreendido aos quatro ventos após o golpe sofrido pela ex-presidente Dilma Rousseff (PT). Aquele modelo que apelava para uma espécie de romantismo cego, para um saudosismo em verde-oliva já muito desbotado e envelhecido, talvez sempre tenha pertencido a um museu de grandes novidades durante todo esse tempo. Engana-se profundamente quem insiste em reavivar e/ou reeditar uma campanha política ao redor de tal modelo ultrapassado. Por questões óbvias, inclusive.

Fico com as palavras de Octávio Guedes, escritor e jornalista, que tocou na ferida durante o programa Conexão, da GloboNews. Essa é, segundo ele, a eleição “de quem vai cuidar da família“. Grande parte das famílias brasileiras não estão interessadas em discutir “corrupção“, “patriotismo“, “minha bandeira jamais será vermelha” etc., como em outros tempos poderíamos constatar nos debates mais acalorados. Cerca de 33,1 milhões de brasileiros não têm o que comer no Brasil atual, segundo levantamento feito pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional. Ainda segundo o levantamento, metade da população brasileira (58,7%) convive com algum tipo de insegurança alimentar em grau leve, moderado ou grave.

É plenamente possível cravar, diante disso, que o desespero da fome é uma das bandeiras que irá eleger o próximo presidente da República, e não a “insegurança das urnas eletrônicas“. A próxima eleição é de quem irá controlar a inflação e reduzir os preços em diversos setores, e não de quem irá “emparedar” a Petrobras para cobrar explicações sobre os aumentos nos combustíveis – soa até como surreal acreditar que, por exemplo, Arthur Lira (PP-AL) esteja mesmo disposto e empenhado a encampar isso com uma CPI fadada ao fracasso, apoiada amplamente pelo presidente da República.

Essa eleição não é sobre o ódio aos demais, mas sobre a esperança de dias melhores. Não é sobre culpabilizar alguém por algo, mas sobre resolver efetivamente os problemas que aí estão. Acredito que grande parte das pessoas não estão dispostas a arriscar o voto, pelo menos não nesse cenário atual. As pessoas optarão por aquelas que já fizeram algo por elas mesmo que num passado longínquo, comprovando até mesmo o modelo personalista de eleição. É diante desse cenário que também encontramos os motivos de Lula despontar nas pesquisas realizadas por diversos institutos.

Grande parte dos brasileiros pede equilíbrio para resolver os problemas do país. Lula compreendeu isso há tempos; não à toa o seu candidato à vice-presidência é Geraldo Alckmin, ex-tucano traído no ninho que agora experimenta voar num PSB, em parte, voltado para si. Alckmin é sabidamente um exímio articulador político que transita entre diferentes escopos políticos – inclusive entre aqueles que o petista não possui grande influência. Lula também sabe muito bem que o país que possivelmente irá pegar em 2023 não é o mesmo que pegou em 2003. Os efeitos de Bolsonaro sobre a política persistirão enquanto outros candidatos ocuparem a cadeira da presidência.

Insisto, porém, em rebater essa ideia fantasiosa que Lula é a personificação de um comunista rebuscado em essência soviética, modelo esse sepultado há muito tempo. Para quem pode observar o momento político atual com frieza e lucidez, dispensando de imediato qualquer ação que se assemelhe a de uma torcida organizada, Lula já não é o mesmo de antes e, até por isso, continua a reunir ao redor de si a atenção de muitos, além dos questionamentos de outros tantos. Tanto para a tristeza de parte do petismo visceral, quanto para as incertezas da direita tradicionalista.

A menos que o país presencie uma reviravolta surpreendente nos próximos meses, parte expressiva dos brasileiros já fez a sua escolha para a próxima eleição para presidente. O caminho, ao que tudo indica, é mesmo ao centro personalista.

 

* As opiniões aqui emitidas não necessariamente representam o Voz Diária.

 

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